quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Chovia

   A princípio, liguei o rádio, mas preferi o barulho da chuva e os sons que habitualmente se ouve nos dias desertos do campus, tentando acompanhar as ondas sonoras que vinham de longe ou de um quarto do andar de baixo.
Quando as meias são calçadas
   Tive de passar manhã e tarde de chinelos, pois as meias quiseram assistir por mais tempo ao espetáculo das gotas de chuva entre as folhas e optaram por não secarem; até arrisquei apresentar um secador no 220V a um par antigo, mas se molharam no caminho, com tantas flores amarelas caídas na rua escura ao lado das quadras de tênis.
   Ao voltarmos, dois amigos encontrei nas escadas, com quem passara o dia no cenárico prédio da química em cálculos de mecânica dos sólidos. Meu lanche já estava comprado, vão com Deus.
   Há pessoas imprescindíveis neste mundo, às vezes um andante (ou pulante) desinibido ou dois tímidos na mesa homens do canto da lanchonete, cujos trabalhos... Então você pode em paz e confortavelmente curtir a vida quão intensamente e mais a toda ansiedade pela aventura que lhe ferve quando as meias são calçadas.

Gabriele Sophie

   Gabriele Sophie mora no 323 da Rua Suíça aos seus vinte e vinte mesmo anos de idoneidade e cacoetes... Chove muito por estes dias - depois de inverno tão seco - e a quarta-feira promete muita água. Nesse dia Gabriele estará não muito distante da Rua Suíça, porém longe de sua casa verdadeira, longe das preocupações acadêmicas e longe donde se podem saborear bolinhos sobre o cobertor antes do pôr-do-sol.
   Com descrições já suficientes, contemos o que acontecera naquele dia.
   A barra a direita sustenta uma carga P. Considerando os conceitos de flexão e torção, utilizando os critérios de Tresca e Von Misses e um coeficiente de segurança lambda igual a dois, determine os valores admissíveis. Mas essa barra tem vários eixos, polias engrenadas, indeterminações... Pode ser feita, isso, questão valendo três prontos; a segunda, sete pontos, citar dez jogos do super nintendo. Jogava MegaDrive. Em geral, encontramos três grupos quase equivalentes por aqui, os que jogavam Nintendo, os que jogavam MegaDrive e os que não jogavam. Mas aqueles primos, Mário, tem também o Zelda e aquele outro de corrida...
   Mas professor, que injustiça, a segunda questão não deveria valer sete pontos! Prova às cinco da manhã? Escova os dentes, desce a escada, há homens de terno e chinelos lá em baixo. Olham para ela, por quê? Seguem a mesma direção.
   Espera, eles esperam. "Um café, por favor". Viera turvo, fazendo umas curvas, olha a curva do café, com um ponto branco girando. E tudo escuro, exceto um pássaro branco, mas ela sai do escuro, pergunta se era um Pidgeot e se estava no nintendo, tenta calcular a flexão das asas, mas não conhece muito bem de sistemas dinâmicos, embora aprendesse algo sobre vida durante os onze dias que namorou Rodrigo.
   Passa um homem saltitante brincando de equilibrista, parece criança. Mas e daí? Não vê problemas, ou melhor, vê problemas; mesmo sente, mas não se abala. Ele sabe, ele enfrenta, ele não se prejudica fisicamente, espiritualmente... Ele não se prejudica. Mas seria feliz? É feliz, este que só conhece a felicidade em todas as situações? Por que Gabriele Sophie se viu pensando nisso?
    Homens, muitos homens, e aqueles de terno e chinelos também se levantam, corre para o estacionamento, mas eles vão para a mesma direção, esquece os carros, esquece que se esquecera de algo. Contudo, dois carros sobrepostos? Aguentariam? Talvez se a interação molecular fosse... Não, é apenas um único carro. E os dois homens que se aproximam, na guia, a grama, a rampa...
   -Min.. mão?
   Depois achou que viu uma garota de branco. Gabriele Sophie recebeu alta do hospital na manhã seguinte.

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

A Menina do Rabo de Cavalo (ou: A Macieira)

    Alguns dizem que as mulheres devem soltar os cabelos para estarem mais atraentes, contudo, caríssimo leitor, numa floresta de suecas, catarinenses e tantas mulheres lindas, da macieira é que você sempre se recordará nos momentos de paz com o mundo.
    Existe uma menina com um rabo de cavalo que compõe a mais bela de suas memórias; felizes aqueles que um dia já sentiram sua luz. Ela intriga, pois é provável que você também, a quilômetros de distância daqui, já tenha visto aquela cuja principal característica é não existir outra semelhante e, já um dia apaixonado leitor, felicíssimo é aquele que mais uma vez pôde trocar cores com ela, cores da mais bela especificidade de relacionamento.
    Aconteceu comigo e fará dez anos nessa primavera, fora num acampamento e claro que sua equipe venceu, ou melhor, nossa equipe; sinto muito prazer em lembrar que fui parte importantíssima naquela conquista e, por isso, concluo hoje que ela deve ter olhado para mim.
    A menina do rabo de cavalo não se esforça em demonstrar sua beleza, é a mais graciosa e a mais esperta. Também não ambiciona comandar, todavia é líder nata. Não é tão magra, nem tão alta, é perfeita. Quando tu a assistes, vibras; quando chegas perto, teu corpo todo treme, quase (ou mesmo) perdes o controle. Tu desaprendes a falar; para ela, que homem tu és? Quem é cavalheiro suficiente? Contudo, se bem observares, ela respeita-te.
    Por que tremes cavalheiro, se com ela te animas, fazes rir - e ela gosta de rir -  e sente-se perfeitamente à vontade? Achas arriscado dizer que a ama, pois teme parecer mais um colmo num canavial.
    Encontra um momento, oculta os tiques nervosos e digas, com calma, “você é linda”. Ela irá sorrir, “muito obrigada”, alguma amiga a chama, elas vão; porém, e certamente, depositará um pouco disso em cada uma de suas flores, do mesmo sentimento que te deixará com aquela cara de bobo, sonhando com aquele sorriso, com o “obrigada” e tocar o céu ao ouvir em tua alma o “muito obrigada” da menina com o rabo de cavalo, graciosa, leve e delicada; espero que um dia dancem juntos.
    
    Há um texto machadiano que diz:
"Mulheres são como maçãs em árvores.
As melhores estão no topo.
Os homens não querem alcançar essas boas, porque eles têm medo de cair e se machucar. Preferem pegar as maçãs podres que ficam no chão,
que não são boas como as do topo,
mas são fáceis de se conseguir.
Assim as maçãs no topo pensam que algo está errado com elas,
quando na verdade, eles estão errados...
Elas têm que esperar um pouco para o homem certo chegar,
aquele que é valente o bastante para escalar até o topo da árvore."


Imagem: DeviantArt I don't like camping by j3ssko